sexta-feira, 10 de agosto de 2007

Design Editorial

O texto abaixo foi retirado do site http://www.designgrafico.art.br e é de autoria de Cláudio Prudente. É estimulante para o debate.

Interessante e cativante este assunto. Eu trabalho dentro desta indústria, e é claro que faz parte da minha rotina o exercício constante de ler, discutir, acompanhar temores, soluções e adaptações deste ramo. Mas não sou bobo de arriscar aqui um palpite. Há muitas surpresas, alguns já caíram do cavalo exercitando futurologia nesta área.
Um deles foi Roger Fidler, um respeitável jornalista, designer, professor, executivo por 21 anos da Knight-Ridder, um dos grupos que controlam a comunicação nos EUA. Em 1981 ele comandou um time, dentro da empresa, responsável por criar um substituto ao jornal em papel. Seria um periférico chamado Tablet, leve, barato, com um monitor flat, alimentado com cartões flash vendidos no mercado com a atualização das notícias. Nada muito diferente de um atual notebook ou Palm. O que deu errado? Simplesmente eles não previram o que aconteceria com a internet. O sonho dos donos da empresa era o de ter um produto proprietário, todos pagariam royalties pela invenção. Mas, alguém percebeu a tempo que a banda não ia tocar música só para eles.
Mas não quero fugir da reflexão, e menos ainda de dar alguns palpites. Primeiro: claro, esta indústria ficou velha. Alvin Toffler, notório futurólogo, dizia que a indústria de jornais seria o último negócio com chaminé. Se você entender como ele é feito hoje, percebe isso com mais clareza. O jornal é digital até a gráfica, onde é impresso em um ritmo alucinante, em rotativas automatizadas e robotizadas. As pilhas de jornais saem de esteiras e entram em gôndolas que alimentam caminhões. Daí, até chegar na casa de um leitor, o processo é analógico, no braço, antigo, exige um esforço enorme. Em árvores, combustível e dinheiro.
Mas temos que dar um crédito à resistência desta indústria. Na verdade, olhando a história, ela ainda é jovem. Os jornais, ao menos do jeito que hoje os conhecemos, nasceram com a Linotipo, no final do século XIX. Desde então, em pouco mais de um século, cantaram sua morte em mais de uma ocasião. Quando inventaram o rádio, futurólogos garantiram que a nova mídia, ao permitir divulgar notícias de forma instantânea, grátis, bastava investir em um aparelho, acabaria com os jornais. Inclusive, por garantir a rápida inclusão de amplas camadas populares, que não dominavam o código dos letrados.
Mas não aconteceu. Os jornais cresceram, mais ainda se modernizaram depois do rádio. E o mesmo discurso foi dito com a TV, mas este demorou um tanto para surgir. O jornalismo da TV, em seus primórdios, era uma mera cópia do rádio, apenas com a imagem quase estática de um locutor. Ela parecia destinada às variedades, não ao jornalismo. Mas na década de 70 as coisas começaram a mudar. Câmeras portáteis, agilidade nas coberturas ao vivo, uma nova linguagem passou a dominar o jornalismo e o público gostou, dando audiências inimagináveis antes. Os jornais se preocuparam. E futurólogos voltaram a fazer suas previsões. De imediato, todo o design dos jornais nos anos 80 teve uma enorme influência da linguagem jornalística da TV. Textos curtos (justificavam dizendo que os leitores não tinham mais tempo de ler), muita cor, gráficos. Um exemplo disso: o USA Today, jornal americano criado nesta época. Ele parecia ser a versão impressa da TV.
Venceram a guerra? Não existiu a batalha, de fato. MacLuhan já havia dado as pistas nos anos 70. TV é um meio quente, te domina, você chora com o drama, se envolve, mas ela não consegue aprofundar a informação com a mesma facilidade que um jornal, com seus boxes explicativos, infográficos, seu volume de texto. Esta cópia deixou de ser um mito, mas levou mais de uma década para a ficha cair na cabeça de empresários e de futurólogos. Para alguns poucos, ainda nem caiu.
Hoje, voltaram os temores de perda de mercado com a internet. Faz sentido. Ela vem alterando radicalmente o modelo de vários negócios. Se o rádio tinha som, onde o jornal não podia concorrer, a TV tinha ainda o movimento, a internet, além disso tudo, traz basicamente o mesmo conceito de página. Ela é muito tipografia, texto, colunas, títulos, pontos de entrada, fluxo de leitura em hierarquia no material, tal como revista, jornal. Mário Garcia, um dos mais conhecidos desenhadores de jornais em todo o mundo, discorda, diz que a internet é mais a linguagem do livro. É uma boa e longa polêmica.
Mas ainda vivemos promessas. Embora de respeito. Hoje mesmo no caderno de Informática do Globo há uma excelente matéria que comenta a pesquisa do papel inteligente. Tudo está muito adiantado. Na verdade um chinês (sempre eles), Chien Tang, da Kodak, usou o conceito da eletrofosforecência de compostos orgânicos, para dar origem à fabricação das telas de LEDs orgânicos. Somando o atual estágio de redes WiFi, os RFID (Radio Frequency IDentification) e a recente solução da NEC para baterias, a ORB, de Organic Radical Battery, uma manta de menos de um terço de milímetro de espessura, flexível, dobrável, não inflamável, não explosiva, isenta de compostos tóxicos como metais pesados (níquel, mercúrio, chumbo ou cádmio) e biodegradável por se tratar de um polímero orgânico, temos chances de resolver algo que sempre me pareceu a maior perda com o fim dos jornais (e revistas, se quiserem apostar): a portabilidade. Não há nada de mais confortável que ler em uma rede, ou numa boa poltrona, ou mesmo na cama. Até aqui não imaginava uma traquitana eletrofosforecente me acompanhando neste momento de raro prazer. Mas estou aberto para novos paradigmas.
Sem dúvida é um mundo novo, né? Uma boa aposta, e do bem, eu diria. Precisamos de um planeta mais limpo. Mas por hora, não é um mundo sem designers de notícias, gente que pensa em como melhor trabalhar uma interface para que o que lá esteja dito, melhor dito, visto, pensado. Esta página tanto convive hoje na web como no igual retângulo de papel. E hoje, até muito ao contrário, a volta dos temores de mudanças nos negócios nos jornais, principalmente, favoreceu neste ano a alta no conhecimento do design editorial. Foram muitos os jornais pelo mundo que redesenharam suas páginas, de olho em leitores perdidos para a internet, para novos hábitos. A lista é grande, vamos lembrar do The Guardian, do Le Monde, do Le Figaro, jornais de peso, entre muitos outros. Mudanças em formatos, em conceitos de design.
Designers editoriais vivem um bom momento. Portanto as apostas são grátis. Minhas fichas dizem que muita coisa vai mudar, sem dúvida: já vejo movimentos. Mas seja lá como for, pode até ser um mundo sem papel, mas não será um mundo sem designers.
Abraços,

Cláudio Prudente

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